Fui convidada pela Casa Projetos Literários em parceria com a Revista Conexão Literatura para escrever um Conto de Natal. E claro que foi inspirado em Scamonis, mas dessa vez quis focar numa história especialmente para as crianças.
Era uma vez um reino mágico chamado Scamonis, localizado no fundo do mar. Lá havia um lindo castelo de pérolas onde uma princesa sereia dormia embalada pelas ondas azuis e cristalinas.
– Princesa Ana, hora de levantar! – um polvo cor-de-rosa entrou no meu quarto. – Pode tirar as nadadeiras dessa concha urgentemente ou a sua avó, a rainha Midi, fará a maior turbulência nas águas deste castelo. – e foi logo abrindo as cortinas de algas marinhas da janela.
– Bom dia pra você também Srta. Polvina! – eu me espreguicei lentamente dentro da concha exibindo a minha cauda azul com dourado. – E você sabe muito bem que a rainha é a sereia mais doce que conhecemos, não é de “turbulências”.
– É… tem razão. – ela suspirou. – Porém, temos muito a fazer no dia de hoje, lembra?
– E como não lembraria. – sorri. – É o nosso primeiro Natal no reino de Scamonis. – nadei para o meio do cômodo e comecei a girar repetidas vezes formando bolhas de ar por todos os lados. – Eu simplesmente amo o Natal! E a propósito, quais são as notícias do reino?
– Hunf! Nem queira saber menina-sereia! – ela resmungou. – As ostras estão em greve e não estão produzindo uma pérola sequer, houve uma pequena discussão entre a Dona Moreia e o Sr. Molusco pelos corais, mas ninguém saiu ferido, um bando de tartarugas turistas chegou pelas correntes migratórias e deve ficar por um tempo, só espero que não faça bagunça. Mas o pior problema que estamos enfrentando é com Mister Shark, o tubarão-martelo. Ele ficou indignado porque foi excluído do amigo-secreto. Não temos culpa se ele não controla aquele apetite! O peixe-boi marinho Mumuuum quase levou uma mordida e foi fazer reclamação no escritório da Sra. Raia.
– Hum… Entendo! Vamos resolver isso. – falei. – O Natal não é momento de brigar, e sim de ficarmos juntos, como uma família. Dia de celebrar o nascimento de alguém muito especial.
Fui até a janela e admirei o conjunto de casas-conchas que se estendia a perder de vista pelo reino. Era um colorido incrível. Sereias e tritões nadavam alegremente em todas as direções exibindo suas roupas bonitas cheias de pedrarias. Peixes de tamanhos variados brincavam ao redor das rochas e lindos cavalos-marinhos passeavam perto das algas.
Donatello, meu companheiro de aventuras, veio nadando ao meu encontro. Ele era uma tartaruga perolada, espécie rara de tartaruga marinha. Seu casco brilhante era formado por placas azuis-turquesa que se uniam como um quebra-cabeça e também possuía manchas douradas nas nadadeiras.
– Olha quem resolveu aparecer. – acariciei Don com cuidado. – Quer me acompanhar, amiguinho? – e ele apenas balançou a cabeça como se estivesse concordando.
Ajustei a minha coroa de três pontas na cabeça e saí em direção ao salão para ver o ensaio musical natalino.
– E um, e dois, e um, dois três, vai! – falou o Sr. Caramujo regendo o restante da orquestra com entusiasmo.
Lagostas, camarões e caranguejos começaram a tocar seus instrumentos musicais desordenadamente. E o que deveria ser uma linda melodia acabou sendo um verdadeiro desastre. Até Donatello se afastou um pouco, incomodado por aquele barulho.
– Chega! Chega! Chega! – o Sr. Caramujo se exaltou. – Eu já falei uma centena de vezes para vocês estudarem o DÓ, RÉ MI, FÁ, SOL, LÁ, SI. – ele parecia preocupado. – Acho que treinar crustáceos foi uma péssima ideia!
– Não fique assim, Sr. Caramujo. – eu me aproximei. – Tenho certeza que vamos ter um lindo espetáculo logo mais. – e notei quando suas bochechas ficaram vermelhas.
Segui em direção à entrada do castelo acompanhada por Don.
– Mais para a esquerda, queridinhas. – Flip-Flip, a golfinha fofa, ajudava na montagem da Alga de Natal. – Isso mesmo, estrelinhas-do-mar, se espalhem pela alga gigante como se fossem enfeites. E quanto a vocês, peixinhos, fiquem nadando em volta da alga para dar o colorido. As conchinhas estão belíssimas penduradas nas extremidades. Ah, como estou orgulhosa!
– Olá Flip-Flip. – falei. – Percebo que está fazendo um lindo trabalho. Esta Alga de Natal está parecidíssima com as Árvores de Natal da terra.
Mas ao ouvirem a palavra terra, houve um grande tumulto. Todos os peixes, estrelas-do-mar e conchas se assustaram e fugiram apavorados.
– Voltem aqui! – Flip-Flip se desesperou. – Parem! – Mas foi tarde demais. Não sobrou uma concha para contar história. A alga gigante agora estava vazia, murcha e desengonçada. – Que pesadelo! Princesinha Ana, você sabe que não pode falar essa palavra chamada te-te-terra. Sabe o quanto isso nos causa medo…
– Eu sinto muito! – toquei na alga destruída, tentando arrumá-la. – É melhor eu ir nadando… – e deixei Flip-Flip conversando com as águas-vivas para substituírem as estrelas.
A noite chegou e o castelo se encheu de sereias, tritões e animais marinhos. A rainha Midi se ergueu do trono e elevou o tridente com a delicadeza de uma verdadeira dama.
– Povo de Scamonis – disse a rainha. – Minha neta, a princesa Ana, organizou esta festa maravilhosa. Espero que todos se divirtam e aprendam sobre o espírito de Natal: renascimento e esperança. Devemos amar uns aos outros. É isso mesmo, Ana?
– Sim, vovó! – falei com orgulho. – Que comece a música! – pronunciei esta frase morrendo de medo do que estaria por vir.
Sr. Caramujo e orquestra iniciaram a melodia e um coro de crianças sereias entoou uma canção.
“Bate a concha pequenina. Não é de Belém. Já nasceu o Deus menino. Para o nosso bem. Paz no reino de Scamonis. Conchas a cantar. Abençoe Deus menino. Este nosso mar”.
– Tivemos que fazer uma pequena adaptação, princesa. – o Sr. Caramujo sorriu para mim.
A Alga de Natal ficou no meio do salão e estava magnífica. A fofura da golfinha Flip-Flip conseguiu convencer todos os enfeites vivos a voltarem aos seus devidos lugares.
– Chegou a hora do amigo-secreto. – pronunciei. – Como eu dei a ideia dessa brincadeira, irei começar. Minha amiga secreta é cor-de-rosa e tem oito braços.
– Sou eu! – Srta. Polvina falou emocionada.
– Espero que goste. – entreguei-lhe o presente. – Tem uma pulseira para cada tentáculo.
A Srta. Polvina deu um chapéu de conchas para a golfinha Flip-Flip, que presenteou a tartaruga Donatello com um colar de pedrinhas. Don por sua vez tirou o Sr. Molusco e o presenteou com uma linda bengala para que ele pudesse andar com mais velocidade. Mister Shark que até então não iria participar da brincadeira, entrou em acordo para não comer os convidados e presenteou justamente o peixe-boi Mumuuum com uma capa de super-herói feita com algas. Acho que eles fizeram as pazes. E a festa seguiu alegre e o mais importante, cheia de amor!
Viva Scamonis! Viva o Natal! Viva o Deus menino!